Outubro. Férias chegando, que alegria! Provas finais também chegando, que agonia! O que não foi feito durante o ano inteiro, tem que ser recompensado. E toca estudar, e estudar, e estudar…e fazer promessas para não ficar de recuperação. No meu tempo de estudante, quem passava direto saía de férias mais cedo.
Isso significava uma semana a mais na fazenda, na roça, com todas as delícias: trote a cavalo, melancia na roça, leitinho espumante no curral — direto do peito da vaca para a caneca. E ainda andanças pelo mato, colhendo gabiroba, cajuzinho, maminha cadela, mangaba, jatobá e inúmeras outras gostosuras.
Papai era gerente da fazenda do Sr. Antônio Paniago e dona Helena, gente boa até não poder mais. Fazenda no Mato Grosso, pertinho do Parque das Emas, que naquele tempo ainda era grande, um descampado, sem limite e sem cerca.
Notas garantidas a duras penas, lá íamos nós, minhas irmãs e eu, para a fazenda. Estrada de chão, escorregadia – já que sempre em novembro chovia muito – e lamacenta. De vez em quando o carro escorregava, rodopiava e ficava atravessado na estrada. Certa vez, o carro do papai deslizou, rodou e virou de “cara” para trás. Um susto! Para nós tudo era festa. Mamãe rezava sem parar, pedindo a proteção divina. Muitas vezes o carro atolava e tínhamos que descer, cortar galhos e paus – – para colocar embaixo dos pneus – tirar a lama e empurrar o carro. Brum…brum….brum…Saiu! Saiu! Íamos correndo atrás na maior alegria!
Saíamos cedinho e chegávamos à noite. Sorte nossa! Porque à noite havia a expectativa de ver a Cidade dos Cupins – assim mesmo, com letras maiúsculas! Puro encanto! Aquele mundão de luzes, brilhando, brilhando, enchia nossos olhos de espanto. Nada sabíamos sobre o tal fenômeno da bioluminescência. Eram só os vagalumes…que moravam nos cupins. Simples assim!
Se não compreendíamos a bioluminescência, de vagalumes entendíamos muito: era comum enchermos os vidrinhos com eles para brincarmos de lanterninha. Depois os soltávamos. Na noite seguinte, pegávamos novamente; afinal, o melhor era caçar vagalumes e disputar quem conseguia pegar mais.
Tantos anos passados! Filhos e sobrinhos formam um grupo para visitar o Parque Nacional das Emas e observar de perto a bioluminescência. Eu me empolgo. Quero ir também. E depois de tanto tempo, contemplo, encantada, os cupins brilhando, brilhando! Chuva e lama, mas quero ver de perto. Desço do trailer com meu netinho Pedro nos braços. “Cuidado! Há perigo de cobras!”— diz o guia. Sentimo-nos frustrados, o Pedro e eu. Quero ver bem de pertinho.
– Vamos mais perto, vovó!
– Não podemos. O guia disse que é perigoso.
– Ah! Mas o tio Lúciu e o outro rapaz estão lá…
E ouço, pesarosa, a reclamação do Pedro:
– Eu queria ser adulto pra ir mais perto!
Sônia Maria Rezende Fernandes
Moradora de Mineiros, Goiás, nascida e criada na região do Parque Nacional das Emas.
É avó do Pedro e Professora aposentada do Estado de Goiás (Colégio Estadual Dep. José Alves de Assis, Mineiros).
Na foto abaixo, Sônia está com o filho, o neto (Pedro) e a anta Matilde, no Parque Nacional das Emas, em Goiás (Novembro de 2018).
Texto por Tiago Carrijo
Publicado originalmente em 03/12/2018