Andando pelas grandes estradas brasileiras, basta olhar um pouco para o lado para perceber inúmeros cupinzeiros brotando do chão. Cada um daqueles concentra milhares de operários e soldados. Da mesma forma, milhares de seres humanos se aglomeram em cidades, maiores ou menores. Mas o que fez seres humanos e cupins viverem em sociedade?!
Foi essa a questão que o pesquisador venezuelano Klaus Jaffe tentou responder utilizando algo crucial para evolução: energia! Em um trabalho publicado em 2010, Klaus mostrou que quanto mais indivíduos em uma cidade ou colônia de insetos, mais eficiente é o consumo energético daquela sociedade. Isto é, quanto maior o grupo social, menor será o consumo de energia por habitante. A conclusão do autor também vale quando comparamos indivíduos solitários e grupos sociais, ou seja, uma sociedade com 100 habitantes, consome menos energia do que os 100 habitantes vivendo sozinhos.
Mas como ele comparou essas diferentes sociedades? Para realizar esse estudo, Klaus utilizou um modelo conhecido na ecologia, a “lei de escala metabólica”, que diz que “quanto maior o organismo, menor o consumo de energia por quilograma”. Um exemplo prático dessa lei, é que o metabolismo dos elefantes é mais eficiente que o nosso, até porque, se eles consumissem alimento na mesma proporção que nós, iam comer até as panelas!
Pensando nessa lei para indivíduos, Klaus Jaffe propôs uma analogia para sociedades, e se perguntou se grupos maiores – assim como organismos maiores – deveriam ter um consumo energético mais eficiente (afinal há quem diga que sociedades numerosas de cupins e abelhas, por exemplo, podem ser consideradas um superorganismo). Para testar sua hipótese, o pesquisador utilizou dados de outros artigos sobre o consumo de energia de:
Três espécies de formigas;
– Uma de cupim (os Nasutitermes corniger, que logo mais aparecerá no quadro “cupim da semana”);
– Uma de abelha;
– Gasto de energia das cidades brasileiras, dinamarquesas e americanas(somente dos estados da Geórgia e Tenessee).
Para as cidades, o autor utilizou somente o consumo de energia elétrica, enquanto que para os insetos sociais, utilizou a energia total consumida pelas colônias. Para que esses dados fossem comparáveis, o autor os converteu para a mesma unidade de medida, e posteriormente, criou uma variável que representava a sinergia social das colônias e cidades.
Sinergia é como o movimento dos atletas no nado sincronizado, para conseguir o efeito bonito de formar uma dança harmoniosa. São ações conjuntas entre organismos, com finalidade de realizar uma tarefa. Para o autor, a vida em sociedade é mais “econômica”, justamente por conta dessa sinergia.
Os resultados nos permitem afirmar que cidades brasileiras são, em média, mais eficientes que as dinamarquesas e americanas utilizadas no estudo. Apesar disso, os resultados indicam que grandes metrópoles como São Paulo e Rio de Janeiro não são tão econômicas quanto se esperava. O consumo de energia per capita dessas cidades ficou muito acima do previsto, portanto, o autor o sinergismo para de crescer depois de certo valor populacional. A partir desse valor o efeito passa ser contrário e a cidade começa a gastar mais energia que o convencional. Segundo Klaus, isso se deve ao fato de que grandes metrópoles possuem dinâmicas sociais que diminuem o grau de sinergia.
Mas será que temos um exemplo prático dessas ações?!
Quando uma colônia de cupins é ameaçada por algum predador maior, rapidamente é protegida por soldados. Quanto maior a disponibilidade de cupins soldados, menor será o consumo que cada um fará naquele campanha. Se houverem poucos soldados para proteger o cupinzeiro, todos terão que desempenhar maiores esforços, além de correrem maior risco de morte em combate, o que de certa forma também é consumo de energia para o cupinzeiro. Se tiver curioso pra saber mais sobre outra ação conjunta desses animaizinhos, acesse o link e aproveite para conferir ótimas dicas sobre a importância da quarentena.
Uma descoberta muito significativa do estudo foi que as colônias de cupins tiveram resultado mais eficiente no consumo de energia quando comparadas com colônias de abelhas e a maioria das colônias de formigas (cupins são demais, fala sério!). Isso se dá, pois a sinergia social nas colônias de nossos queridos cupins é maior do que a sinergia das colônias de outros insetos sociais.
Por fim, e não menos importante, a Ciência nos mostrou que, pelo menos frente as sociedades utilizadas no estudo, as cidades brasileiras e as colônias de cupins são exemplares quando o assunto é economia de energia. Mas não se esqueça, se a população for muito grande, pode comprometer esse ganho. 😉
Texto por Samuel Marques Aguilera Leite
Publicado originalmente em 17/04/2020
Referências:
Jaffe, K. 2010. Quantifying social synergy in insect and human societies. Behav Ecol Sociobiol 64:1721–1724.
Corning, P.A. 1998. The synergism hypothesis: on the concept of synergy and its role in the evolution of complex systems. J Soc Evol Syst 21:133–172.
Brown J.H., Marquet P.A., Taper M.L. 1993. Evolution of body size: consequences of an energetic definition of fitness. Am Nat 142:573–584